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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

SINFONIA DAS ÁRVORES

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SINFONIA EM TRES CORES
Rubem Alves

                  "Thoureau que amava muito a natureza, escreveu que se um homem resolver viver nas matas para gozar o mistério da vida selvagem, será considerado pessoa estranha ou talvez louca.
                    Se, ao contrário, se se puser a cortar as árvores para transformá-las em dinheiro (muito embora vá deixando a desolação por onde passa), será tido como homem trabalhador e responsável.
Lembrei-me disso ao ver um ipê rosa florido.
                     A beleza era tão grande que fiquei ali parado, olhando sua copa contra o céu azul.
                    Os homens normais, encerrados em suas pequenas bolhas metálicas rodantes, devem ter imaginado que não funciono bem.
                   Gosto dos ipês de forma especial. Questão de afinidade.
                   Alegram-se em fazer as coisas ao contrário.
                   As outras árvores fazem o que é normal: abrem-se para o amor na primavera, quando o clima é ameno e o verão está pra chegar, com seu calor e chuvas.
                      O ipê faz amor justo quando o inverno chega e a sua copa florida é uma despudorada e triunfante exaltação do cio.
                      Conheci os ipês na minha infância, em Minas, os pastos queimados pela geada, poeira subindo nas estradas secas, e no meio dos campos, os ipês solitários, colorindo o inverno de alegria.
                      O tempo era diferente, moroso como as vacas que voltam em fim de tarde.
                      As coisas andavam ao ritmo da própria vida, nos seus giros naturais.
                      Mas agora, de repente, esta árvore de outros espaços irrompe no meio do asfalto, pincela a cidade com outrs cores, interrompe o tempo urbano de semáforos, buzinas e ultrapassagens e eu tenho de parar ante esta aparição de um outro mundo.
                          Como aconteceu com Moisés, que pastoreava os rebanhos do sogro e viu um arbusto pegando fogo, sem se consumir.
                          Ao se aproximar para ver melhor, ouviu uma voz que dizia: "Tira as sandálias dos teus pés, pois a terra em que pisas é santa."
                         Acho que não foi sarça ardente. 
                         Deve ter sido um ipê florido.
                         De fato, algo arde sem queimar, não na árvore, mas na alma.
                         E concluo que o escritor sagrado estava certo.
                         Também eu acho sacrilégio chegar perto e pisar as milhares de flores caídas, tão lindas, agonizantes, tendo já cumprido sua vocação de amor.
                       Mas sei que o espaço urbano pensa diferente.
                       O que é milagre para alguns, é canseira para a vassoura de outros.
                       Melhor o cimento limpo que a copa colorida.
                       Lembro-me de um pé de ipê, indefeso, com sua casca cortada a toda volta.
                      Meses depois, estava morto, seco.
                      Mas não importa.
                      O ritual de amor no inverno, espalhará sementes pela terra e a vida triunfará sobre a morte, o verde arrebentará o asfalto.
                      A despeito de toda nossa loucura, os ipês continuam fiéis à sua vocação de beleza, e nos esperarão tranquilos.
                 Ainda haverá de vir um tempo em que os homens e a natureza conviverão em harmonia.
                 Agora são os ipês rosa. Depois virão os amarelos. Por fim, os brancos.
                 Cada um dizendo uma coisa diferente.
                 Tres partes de uma brincadeira musical, que certamente teria sido composta por Vivaldi ou Mozart, se tivessem vivido aqui.
                 Primeiro movimento "Ipê Rosa", andante tranquilo, como o coral de Bach, que descreve as ovelhas pastando. Ouve-se o som rural do órgão.
                Segundo movimento "Ipê Amarelo", rondo vivace, em que os metais, cores parecidas com as do ipê, fazem soar a exuberância da vida.
                Terceiro movimento "Ipê Branco", moderato, em que os violoncelos falam de paz e esperança.
                Penso que são uma metáfora do que poderíamos ser. Seria bom se pudéssemos nos abrir para o amor no inverno...
               Corra o risco de ser considerado louco: vá visitar os ipês. E diga-lhes que eles tornam o seu mundo mais belo.
               Eles nem o ouvirão e não responderão.
               Estão muito ocupados com o tempo de amar, que é tão curto.
               Quem sabe acontecerá com você o que aconteceu com Moisés e sentirá que ali resplandece a glória divina."
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COMENTÁRIO DA DENISE:
                 Só não consigo concordar com Rubem Alves num ponto: quando ele diz que as flores não irão ouvir.
Ouvem, tenho certeza disto.
                        Todas as manhãs, ao regar minhas flores maravilhosas, eu digo a elas como estão bonitas, digo ao jasmim que não existe perfume mais inebriante que o dele... faço os gerânios saberem que adoro suas cores todas... falo com minhas duas grevilhas - as árvores da frente de casa - que se enchem de lindas flores vermelhas e que atraem de dia, os beija-flores e à noite, os morceguinhos - uma espécie muito pequena que vem em busca de seu néctar. E para alegrá-las, coloquei em seus troncos, muitas orquídeas, que lhes fazem companhia.
  E, claro, não esqueço das minhas primaveras que estão sempre colorindo de magia meu jardim. Podem achar que deliro, que sou louca - sou e adoro sê-lo - mas a impressão que tenho é que, quanto mais eu converso com elas, mais lindas elas ficam.
 Também tenho a nítida impressão, de que elas querem mesmo exibir-se, como se dissessem: estamos aqui pra colorir sua casa, pra trazer energia boa e perfumar seu jardim.
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FRASE DA VEZ:
"Ilumine sua vida com a delicadeza das flores." (A. D.)
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 FLORESTA ENCANTADA
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