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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O MAIS REMOTO DO PLANETA



 A SIBÉRIA
A Sibéria é uma vasta região da Rússia e do Norte do Cazaquistão, integralmente no norte da Ásia, estendendo-se dos Urais ao Oceano Pacífico, e para sul desde o Oceano Ártico até aos montes do centro-norte do Cazaquistão e até à fronteira com a Mongólia e China.
 
A Sibéria ocupa 10 007 400 km2 (58% da área da Rússia). Geograficamente, pode ser dividida na Planície Ocidental Siberiana e o Planalto Central Siberiano.
A Planície Ocidental Siberiana consiste principalmente de depósitos aluviais do Cenozóico e é extraordinariamente baixa, tanto que um aumento do nível do mar de 50 metros causaria a inundação de todas as terras entre o Oceano Ártico e Novosibirsk. Os rios principais são o Ob e o Ienissei. Na zona sul da planície, onde já não há permafrost, terras de pastagem (estepes) formavam a vegetação original, hoje já é rara.
O Planalto Central Siberiano situa-se entre os rios Ienissei e Lena. Ocupa cerca de 3,5 milhões de km2, e a altitude máxima é de 1 701 metros. O território é ocupado principalmente por florestas de coníferas. Os recursos minerais são abundantes, especialmente carvão, ferro, ouro, diamantes e gás natural.
O clima varia entre o polar e o continental. Na Sibéria situa-se o local habitado mais frio do mundo, a aldeia de Oymyakon.
 Mina de diamantes

A conquista e colonização da Sibéria pelos cossacos, e pelos russos, feita no século XVI, em geral, têm muitos paralelismos com a conquista do Oeste Americano: um povo europeu tecnologicamente mais desenvolvido invade territórios ancestralmente ocupados por povos nômades, com menos sofisticação tecnológica e um estilo de vida, tradições e maneira de olhar para o mundo muito diferentes das do povo invasor, armado também com a sua cultura judaico-cristã. 
O resultado inevitável é a derrota militar dos povos com menor potencial tecnológico, que traz consigo uma assimilação cultural em grande medida feita pela força. Todos os povos europeus que se expandiram pelo mundo, derrotando militarmente as culturas autóctones de menor potencial tecnológico, utilizaram alguns aspectos mais diferentes das culturas locais como pretexto para a sua classificação como inferior, justificando assim não só a dominação mas todo o tipo de desmandos que chegaram mesmo à escravatura e ao genocídio. Os russos na Sibéria não foram exceção.
Entre os traços culturais usados para justificar a dominação e a assimilação dos povos siberianos contam-se em lugar de destaque os ritos funerários. Devido à dificuldade em abrir campos com os instrumentos de que dispunham em solo gelado ou encharcado, as culturas siberianas não enterravam os seus mortos. Os koryaques e os chukchis dissecavam-nos. Os yukaghires desmembravam-nos e depois distribuíam as várias partes, já secas, pelos familiares mais próximos. 
Estes pedaços do ente querido eram apelidados de "avós", funcionando como amuletos. Os kamchadales, pelo seu lado, tinham em mente as necessidades de transporte no Além: davam os cadáveres a comer aos cães, para que os falecidos tivessem uma boa equipe de cães a puxar-lhes o trenó.
Os russos, devido às suas tradições cristãs, viam estes povos como bárbaros. Curiosamente, nesta mesma altura (séculos XVII e XVIII), a Europa ocidental olhava para o Czar e os seus súbditos de uma forma semelhante.
Museu da cidade de Taltsy

No entanto, os cossacos rapidamente aprenderam que lhes sairia muito caro desprezar toda a experiência acumulada pelos siberianos ao longo das muitas gerações que levaram a encontrar as melhores soluções de sobrevivência no clima agreste da Sibéria e na escassez local de recursos.

 
Os costumes alimentícios locais foram rapidamente adotados por eles, e muitos destes costumes ainda perduram. Os ostyaques e voguls, por exemplo, bebiam sangue fresco de renas e, quando tal não era possível, aproveitavam-no para fazer panquecas ou para engrossar a sopa. Os peixes geralmente eram comidos cru, e, como acompanhamento, bebia-se seiva de bétula. 
 Rua Tarskaya em Omsk

Os quirguizes, buriates e yakutes gostavam muito de kumis (leite de égua fermentado). Os yakutes orgulhavam-se particularmente do seu "alcatrão de leite" (não sendo a tradução fiável). Trata-se de uma mistura cozida de carnes, peixes, raízes, ervas e cascas de árvores. Tudo isto era bem triturado e misturado. Em seguida, adicionava-se farinha e leite.
 Trans Siberiana
Os Khanty, povo indígena da Sibéria, vivem da caça, da pesca e da criação de renas. Os animais são usados como transporte, sua carne pele é usada na produção de agasalhos e sua carne consumida.
No entanto, os campos de extração de petróleo instalados na área ameaçam o equilíbrio natural, já que afugentam os ursos - predadores naturais das renas - aumentando a concentração destes animais em outras partes da região.
Catedral de Krasnoyarsk


 Universidade da cidade de Tomsk
















quarta-feira, 21 de agosto de 2013

MAR DE EMOÇÕES

 

O MAR DE EMOÇÕES

  IVAN MARTINS

Um comentário azedo é capaz de estragar uma tarde de sábado. Uma resposta ríspida, logo cedo, coloca um dia inteiro na direção errada. O sentimento de incompreensão nos lança em isolamento a 100 metros do outro, ainda que sentados no mesmo sofá. Às vezes é algo que ela falou, às vezes é a maneira como ele disse. De alguma forma, produz-se a fagulha que inicia uma briga ou cria o distanciamento - e, dado o primeiro passo, somos incapazes de voltar atrás. Quem nos salva de nós mesmos se estamos mergulhados em nossas mais sombrias emoções?
Algumas vezes, tenho a impressão de que os sentimentos controlam a totalidade nossa existência. A sua, a minha e a de todos os demais. Nessas ocasiões, a racionalidade me parece uma camada muito fina do que nos faz humanos. Sob a película da lógica e das palavras, move-se dentro de nós um mar de emoções que nos comanda - e, a despeito de nós mesmos, elege as nossas disputas e define as nossas afinidades.
Pense nos casais que você conhece: as pessoas se atraem por razões insondáveis, se juntam por motivos que não conseguem explicar e se querem, ou deixam de se querer, sem que saibam por quê. Para a maioria de nós, na maior parte do tempo, as causas das nossas afinidades são misteriosas.
No início da paixão, ou próximo do seu desfecho, forma-se uma corrente de sentimentos que lembra a volta de uma onda - ela nos arrasta numa única direção, de forma assustadora. Está em nosso poder recusar ou se render a esse empuxo, mas é impossível negá-lo. Ou inventá-lo, se não existe.
Entre o início glorioso e o final vale de lágrimas, nos cabe conviver no dia-a-dia das nossas emoções. As minhas, as suas, a dela. Não é fácil. A gente conversa, combina, acerta, discute, promete e, logo adiante, se contradiz, levado por sentimentos mais fortes do que nós.
Penso em coisas singelas, como deixar-se levar pela irritação ou pela impaciência, mesmo sabendo que não deveria. Penso no ato de despejar sobre o outro os nossos medos e necessidades. Penso na nossa teimosia, nas nossas explosões infantis de frustração, na imensa preguiça que assoma e nos paralisa, no egoísmo diário, mesquinho, ridículo, arraigado, que nos impede de estender a mão. Na ira. Penso no ato de sabotar a vida com doses miúdas de autocomiseração e autocomplacência.
Penso, sobretudo, no gosto de muitos de nós por chafurdar em sentimentos ruins.


Vocês já perceberam isso? Certas emoções embriagam. A raiva, a pena de si mesmo, o pessimismo... Uma vez que a gente embarque nesses estados de espírito, eles nos encarceram num círculo de irracionalidade. Somos tomados pelo prazer de sofrer e antecipar o pior. Praticamente desejamos o apocalipse emocional e o extermínio dos nossos afetos. Essa catarse é tão poderosa que, enquanto ela dura, nos impede de pensar de uma forma que não seja exaltada e destrutiva. Autodestrutiva, em geral.
Sabem do que estou falando, não? Acontece em brigas de adolescentes e de gente madura. Alguém está inseguro, entra em surto e parece imune à razão, determinado a chutar o pau da barraca a qualquer custo. Penso em quantos milhões de pessoas não tomaram decisões estúpidas no meio de um furacão emocional dessa natureza.
Acho que por trás das relações duradouras o que existe é um cenário totalmente contrário ao dessas crises. Por falta de um nome, vamos chamar esse fenômeno de compreensão profunda. Ela acontece nos casais montados sobre uma base de entendimento não racional. Não é apenas atração que os liga, não é apenas desejo. Muito menos são as concordâncias ideológicas ou intelectuais. Ocorre entre eles uma conexão silenciosa de personalidades que produz ao mesmo tempo conforto e intensidade. Aquilo que a gente chama de amor talvez seja apenas esse encontro fortuito de subjetividades.
De alguma forma, minhas emoções profundas se comunicam com as suas emoções. Isso torna a vida mais fácil e ao mesmo tempo mais intensa. Por alguma razão, você tem um atalho que chega até mim. Nossos sentimentos conversam, por isso as trocas racionais ficam mais fáceis. Elas acontecem sobre uma base de compreensão afetiva, muito mais efetiva do que a outra. Arranjos racionais são frágeis, enquanto os emocionais são difíceis de quebrar - mesmo quando lógica compele a isso.
Alguém pode chamar isso de amor, eu chamo de sorte. Chamo também de acerto e trabalho. A gente tem de estar pronto para uma coisa dessas. Tem de perceber quando ela acontece. Uns chegam a essa compreensão precocemente e por si mesmos. Outros precisam de análise e de tempo. Ralando. Muitos nem sabem que existe e nunca alcançarão a sintonia que permite navegar sem bússola o mar das nossas emoções. Azar deles - porque o mar existe, e nele naufragam boa parte dos relacionamentos.