Violinos de colecionador ajudam a contar histórias do Holocausto
Violino com cinco estrelas de Davi é exibido na Universidade da Carolina do Norte, nos EUA
(Foto: Chuck Burton/AP)
(Foto: Chuck Burton/AP)
 Um pouco dessa história está nas mãos de um israelense chamado Amnon 
Weinstein. Fabricante de violinos, Amnon tem uma loja-ateliê em Tel Aviv
 onde guarda 36 violinos de músicos judeus que viveram na Alemanha na 
época do genocídio nazista, inclusive de sua família.
 Nos Estados Unidos, 
onde expôs em abril os violinos pela primeira vez no continente 
americano - na Universidade da Carolina do Norte, em Charlotte -, o 
simpático senhor de 73 anos conta como começou o projeto "Violinos da 
Esperança" e falou sobre a importância de manter a memória do que 
aconteceu. "Estes violinos são como lápides para todos os músicos 
mortos no Holocausto, centenas deles, milhares, minha família."
 Amnon segura violino da coleção (Foto: Ken Lambla)
"O começo é muito prosaico, eu sempre digo. Eu tinha um aluno que veio do leste alemão trabalhar como fabricante de arcos em Israel,
 estamos falando de 15 anos atrás, e no momento em que ele aprendeu sobre
 o Holocausto, ele tentou me convencer a dar uma palestra sobre violinos
 que vieram para Israel em 1936, na associação de produtores de arcos e violinos da 
Alemanha. Levou dois anos para eu dizer sim e depois foi como uma bola 
de neve. Desse tempo em diante, eu tenho trabalhado no projeto 'Violinos
 da Esperança'.
"Em 1936, Bronisław 
Huberman, um grande violinista judeu e o maestro italiano Arturo 
Toscanini, na época número um do mundo, criaram a orquestra filarmônica 
de Israel atual. E Huberman trouxe os melhores músicos da Europa para 
Israel, judeus. Porque ele viveu em Berlim e entendeu o que os alemães 
tinham planejado fazer com os judeus mais para frente. Então ele 
convenceu os músicos a vir para Israel formar essa orquestra e salvou 
cem músicos e as pessoas ao redor - o que dava cerca de 300 pessoas 
salvas dos nazistas.
 Os violinos da coleção de Amnon (Foto: Ziv Shenhav)
A maioria desses músicos que vieram de Alemanha, França, Suíça ou 
Polônia tocava em instrumentos de fabricação alemã. Para eles, naquela 
época não havia problema em usar um violino feito na Alemanha e ser um 
músico judeu. E eles sabiam que em Israel não havia nada, nenhum fazedor
 de violino, não se podia nem comprar cordas. Então cada um trouxe 
consigo ao menos três violinos, violas e violoncelos, pois, em caso de 
quebrar eles tinham que mandar para a Europa de barco para arrumar e 
demorava muito tempo.
 Agora pulemos para 1945, após a guerra. Em Israel, todos sabem sobre as
 atrocidades que os alemães fizeram na Europa. E pode-se dizer que em 
Israel, nessa época, a maioria das pessoas tinha família entre os 6 
milhões de pessoas (mortas no Holocausto). Então, houve um boicote 
completo de qualquer produto de origem germânica, de vacas até qualquer 
produto de casa, incluindo, claro, violinos. Os músicos chegavam e 
diziam 'não vamos mais tocar nesse instrumento'. Alguns quebraram os 
violinos e outros chegaram pro meu pai e disseram 'se você não comprar o
 violino, eu vou queimá-lo'. Então meu pai, sem mencionar nada - ou sentindo algo - adquiriu uma enorme 
coleção de instrumentos de origem alemã. Portanto, aquele fabricante de 
arcos de que lhe falei me convenceu a fazer uma palestra sobre isso em 
Dresden (Alemanha). Depois, num programa de rádio em Israel, eu 
perguntei ao público quem tinha violinos relacionados ao Holocausto e 
hoje tenho uma coleção de 36 violinos assim divididos em quatro 
categorias: a primeira é de violinos que estiveram no Holocausto e de 
que sabemos o nome da pessoa que tocava, e às vezes até temos fotos dos 
donos; a segunda categoria é de instrumentos que estiveram no 
Holocausto, mas de que não sabemos nada de seus donos. Porque, para 
essas pessoas, os violinos sobreviveram à vida, à guerra, os alemães 
precisavam de todos esses músicos para tocar e enganar os judeus para ir
 para a câmara de gás.
 Amnon trabalha em seu ateliê (Foto: Ken Lambla)
 A terceira categoria da coleção são violinos de membros da orquestra, 
tenho muitos no ateliê, e só um deles está pronto para ser tocado. A 
quarta categoria é de violinos usados por músicos populares, que tocam 
em casamentos e bar mitzvahs (cerimônia judaica que insere o jovem na 
comunidade adulta), e muitos deles tocavam em violinos com a Estrela de 
Davi. Os alemães confiscaram milhares de instrumentos pertencentes a 
judeus e é impossível rastrear quem são os donos por causa da falta de 
documentação.
 Todo esse trabalho feito com os violinos é porque estamos deixando de 
volta em condições de serem tocados quase todos os instrumentos. Eles 
são como lápides para todos os músicos mortos no Holocausto, centena 
deles, milhares, minha família. Minha irmã uma vez fez a conta, e quase 
400 pessoas da nossa família morreram no Holocausto.
As famílias judias daquela época eram muito grandes. Só o meu pai tinha 
11 irmãos, imagina quanta gente. Ele e um outro irmão sobreviveram, mais
 ninguém.
Em 1938 meu pai decidiu emigrar para Israel, ele era um músico profissional e também um fabricante de violinos.
Primeiro, prendi a profissão com meu pai, depois fui para a Itália e a França, esse é meu 
currículo como fabricante de violinos. Ganhei prêmios em competições, e 
depois todo meu tempo é dedicado para o 'Violinos da Esperança'.
O primeiro violino chegou até mim por meio de um programa de rádio, 
em Israel. Aí chegou um, dois, fizemos concertos em Istambul e depois 
fizemos um grande concerto em Paris e na época tínhamos só quatro 
violinos. Hoje estamos falando de 36 violinos - 18 aqui em Charlotte (na
 exposição). Você consegue imaginar isso ? Todos em condições de tocar, 
todos para concertos. Há alguns instrumentos que nunca serão restaurados
 e ficarão como evidência para as próximas gerações.
 Por exemplo, eu recebi de um americano, fabricante de arcos, Joshua 
Henry, ele me escreveu um e-mail dizendo que comprou um violino de um 
comerciante judeu e quando abriu o violino ele achou o escrito 'Heil 
Hitler', 1936 e uma suástica. Com uma caneta, escrito
 de um jeito muito agressivo e feio. Nossa opinião é que, não temos 
provas porque o dono provavelmente morreu, mas no ano 1936 havia muitos 
judeus morando na Alemanha e o dono, que era um tocador amador, porque 
não era um violino grande, era um violino normal, alguma coisa aconteceu
 e ele foi num ateliê para arrumar e essa pessoa sem permissão, sem falar
 para ninguém, abriu e escreveu 'Heil Hitler' dentro e não havia como 
fazer isso sem abrir o violino - e isso eu posso confirmar. E então ele 
devolveu o violino para o homem judeu, que tocou com o violino de 'Heil 
Hitler' por toda a sua vida. Os alemães não cometeram apenas atrocidades
 contra pessoas, mas também contra instrumentos.
Um violino é um violino, mas 
um violino com um enorme passado histórico é completamente diferente. E 
cada violino tem uma história diferente. O primeiro que me chegou foi 
muito muito especial, pois, veio do ateliê do homem que foi o professor do
 meu pai. Então era um violino judaico, com duas estrelas de Davi, uma 
inscrição em iídiche e veio do professor de meu pai. O que pode ser 
melhor que isso? Nada.
Os tocadores 
judeus tocavam em qualquer instrumento. Nessa época, estamos falando de 
1900, metade de 1800, era muito comum nas casas judaicas ter violinos 
para tocar nas nossas festividades. Eles eram mais comuns no leste 
europeu - no oeste não se encontra esses violinos - e em geral eram 
muito baratos. A decoração era feita pelos judeus e cristãos faziam 
cruzes também. Neste caso, todos esses instrumentos, na nossa tradição, 
eram pregados na parede, pois, para os judeus ortodoxos era proibido 
pregar qualquer pintura ou ter escultura nas casas, então eles tinham 
violinos.
Esses violinos da exposição levaram um ano e
 meio para serem restaurados. Cada um leva entre três e seis meses. Depende das condições que 
eles estão. Os violinos que vieram do Holocausto estão em péssimas 
condições.
Todo violino é tocado pelo tipo de som que o
 músico gosta e colocado dentro do violino. E quando você é um 
violinista profissional você pode ouvir isso, quando você toca nele 
hoje. E é muito sabido, por exemplo, se pegarmos um instrumento 
pertencente a um grande nome e se tocar corretamente você pode ouvir o 
jeito que a pessoa tocava nele. É algo muito especial, mas é preciso ser
 um violinista educado para isso. Mas é possível sentir.
Eu tomo minhas notas sobre a história dos violinos e registro qualquer informação 
que conseguir, assim como anoto sobre a restauração que fiz. E agora, um professor da orquestra
 daqui vai escrever um livro sobre os violinos, até os que não estão na 
exposição. Na minha coleção eu tenho 20 outros violinos que não 
estão contabilizados, pois, não estão em condições de serem tocados e 
vieram da filarmônica de Israel.
Tem um que temos todas as informações sobre o dono e 
uma foto dele tocando. Aí outro, é o que era do meu pai - não estava no 
Holocausto, mas salvou sua vida, podemos dizer - há outro violino, vindo
 da Romênia, cujo dono veio para Israel, e ele tocava para os vizinhos 
em festividades e toda comida que ele conseguia ele levava para os 
guetos, então no fim do dia cerca de 18 pessoas sobreviveram com essa 
comida extra.
GÊMEOS 
 









 
 
Emocionante demais Denise..lindo ..valeu!
ResponderExcluirHistórias que emocionam!
ResponderExcluirnossa carlos ta muito bem
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